Estávamos no balcão do pavilhão das Caldas da Rainha. Tínhamos acabado de nos apoderar de um banco corrido para três pessoas. Bebíamos cerveja, comíamos pistachos e sopa de peixe com camarão. Os Ciganos D'Ouro tocavam no palco principal da Festa do Avante.
O Zé, que não gosta muito de futebol e percebe ainda menos - conhece um clube que se chama Aston Villa, torce pelo Vitória e tem resquícios de betice pelo Sporting - tem um telemóvel fora do normal. Foi fabricado em Portugal e possui uma antena como a dos transístores antigos que permite receber a emissão dos quatro canais portugueses.
Foi a nossa salvação, já que não existiam televisões à vista para assistir ao jogo. E lá nos sentámos com o telemóvel na horizontal, apoiado numa pilha de copos de cerveja que não parava de crescer, Vimos a primeira parte naquele ecrã de seis centímetros por quatro, mais coisa menos coisa. Quem passava por ali, estranhava, fazia comentários sobre o telefone e perguntava o resultado.
Os funcionários do pavilhão das Caldas queriam saber mais, metiam conversa, faziam piadas, criticavam os brasileiros e o treinador. Queriam que os avisássemos quando fosse golo. E avisámos, mas tinha sido da Dinamarca. Era o meu sinal, levantei-me e fui à casa-de-banho arranjar espaço para mais cerveja.
Segunda parte, a mesma coisa. Aquilo já irritava. Sem sol, via-se melhor o ecrã, mas nada de golos. Os de branco atacavam, os de vermelho defendiam. "Isto só lá vai com uma pinga que tenho aqui para vocês", alertou o camarada de barba grisalha do outro lado do balcão. Serviu meia dúzia de copos com vinho branco regional e foi golo. Menos de um minuto depois, foi golo. Ó homem, você já podia ter oferecido isto antes. Abra mas é mais outra para a gente ganhar isto.
No seguimento de um canto, a bola foi à cabeça de um jogador de branco e entrou na baliza dos "maus". Os festejos foram efusivos, ainda havia tempo para dar a volta. Quem é que marcou? Quem é que marcou? Eh pá, não se vê muito bem, o ecrã é pequeno. Parece o Bosingwa. Não, não, é o Liedson. Silêncio.
Era um golo importante, tão importante como o do Pepe no primeiro jogo que fez pela selecção portuguesa. Menos importante que o do Deco, no seu primeiro jogo como português, contra o Brasil, num particular. Acreditem que não é xenofobia, racismo ou qualquer outra estupidez do género, mas fica sempre uma coisinha estranha na alma com estes golos dos portugueses nascidos no Brasil. É como se tirasse um pouco do mérito, da justiça, da credibilidade, da honestidade.
Tás louco? Isto é o futebol português, nada disso existe.
Gooooooloooooo!!!!
3 comentários:
Eu estive nesse banco de 3!
Eu bebi do vinho regional!
Eu festejei o golo!
:)
sem ver as fotos não é possivel imaginar um jogo visto num telemovel. Um ZTC.
Já lá está a foto, obrigado.
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