Porquê? Why?

Há histórias que têm que ser contadas.
Há exemplos que têm que ser seguidos.
Há personagens que têm que ser desvendadas.
E nós merecemos um jornalismo diferente que nos mostre que ainda vale a pena.



27/06/09

Viva a verdade desportiva

Arusha, Tanzânia

Fernando Mendes é um antigo jogador de futebol, o único que representou os cinco clubes campeões nacionais.

Não é uma figura simpática, nem tem que o ser. Dentro de campo, ficou conhecido pela agressividade e entrega total. Fora dele, tornou-se também reconhecido pelas declarações polémicas. Fernando Mendes decidiu lançar um livro, juntamente com Luís Aguilar, ao qual chamou 'Jogo Sujo', da editora Livros de Hoje.

O site MaisFutebol publicou hoje alguns excertos. O antigo defesa assume com todas as letras o consumo de doping ao longo da sua carreira e diz que essa era uma prática corrente em determinado clube.

Pelas declarações percebe-se que, quem quiser actuar, vai descobrir facilmente a que clube se refere Fernando Mendes. Mas também neste caso isto vai dar em nada. É sempre assim no futebol português.

Aqui estão alguns excertos de 'Jogo Sujo'. Cada um que tire as suas conclusões.

«Em determinado período da minha carreira cheguei a um clube que tinha uma grande equipa, um belíssimo treinador e um presidente carismático. Para além destas qualidades, existiram outros ingredientes que facilitaram o nosso percurso vitorioso. Devo dizer que antes de ir para este clube nunca tinha tido qualquer experiência com doping (pelo menos conscientemente)»

«Os incentivos para correr eram sempre apresentados pelo massagista. Passado pouco tempo de estar no clube, ele aproximou-se de mim, e de outros novos jogadores (...) Disse-me claramente que aquilo que ia dar-me era doping, embora nunca tivesse falado de eventuais efeitos secundários. (...)

«Em alguns clubes onde joguei tomei Pervitin, Centramina, Ozotine, cafeína, entre muitas outras coisas das quais nunca soube o nome»

«Lembro-me de um jogo das competições europeias contra uma equipa que tinha três campeões do mundo no seu plantel. Um deles era um poderoso avançado no jogo aéreo. (...) Apanhei-o várias vezes no meu terreno de acção. Ele era um armário, com um tremendo poder de impulsão. Mas nesse dia eu saltei que nem um louco e ganhei-lhe quase todas as bolas de cabeça (...) O meu segredo: uma pequena vacina, do tamanho de meia unha, chamada Pervitin»

«Em certos treinos víamos um ou dois juniores que apareciam para treinar connosco. Esses juniores não estavam ali porque eram muito bons ou porque tinham de ganhar experiência. Estavam ali para servirem de cobaias a novas dosagens. Um elemento do corpo clínico dava cápsulas ou injecções com composições ilegais a miúdos dos juniores (...) Diziam-lhes que eram vitaminas e que a urina era para controlo interno»

«Se um jogo fosse ao domingo, o nosso médico sabia na sexta ou no sábado quais as partidas que iriam estar sob a tutela do controlo antidoping. Mal tinha acesso à informação, avisava todo o plantel e o dia de jogo acabava por ser directamente influenciado por essa dica»

Para os mais desatentos, cá fica a lista de clubes representados por Fernando Mendes e as respectivas épocas, com o agradecimento ao site www.zerozero.pt

2008/09PortugalCO Montijo
2007/08PortugalSão Manços
2006/07PortugalSão Marcos
2005/06PortugalSão Marcos
2004/05PortugalMontijo
2001/02PortugalV. Setúbal
2000/01PortugalV. Setúbal
1999/00PortugalBelenenses
1998/99PortugalFC Porto
1997/98PortugalFC Porto
1996/97PortugalFC Porto
1995/96PortugalBelenenses
1994/95PortugalBoavista
1993/94PortugalEst. Amadora
1992/93PortugalBenfica
1991/92PortugalBoavista
1990/91PortugalBenfica
1989/90PortugalBenfica
1988/89PortugalSporting
1987/88PortugalSporting
1986/87PortugalSporting
1985/86PortugalSporting
1984/85PortugalSporting

26/06/09

Será?

Xanana Gusmão poderá estar envolvido num caso de corrupção.

Hã? Não me parece, foi a primeira reacção. Mas deixa lá ver o que estão a dizer: "Em causa está um contrato, no valor de 3,5 milhões de dólares (cerca de 2,4 milhões de euros), que Xanana Gusmão assinou com a empresa Prima Food, que venceu um concurso internacional para fornecimento de arroz e que tem entre os accionistas mais importantes Zenilda Gusmão, filha mais velha do chefe do Governo timorense."

Se isto for verdade, há que ser honesto: é uma grande desilusão. Mas vamos esperar antes de espetar já as cruzes no homem.


The man in the mirror

O miúdo que nunca chegou a sê-lo morreu há poucas horas em Los Angeles.

E a imagem que vou guardar não é a do homem de negócios falido, do preto com pele branca, do alegado abusador de crianças, do paranóico das cirurgias plásticas ou do pai pouco extremoso que pendura o filho da janela. Foi tudo isso, é certo, mas prefiro guardar aquela imagem do miúdo dos Jackson 5 que comandava os irmãos mais velhos e sorria para a câmara enquanto dançava como só ele o poderia fazer vestido com as roupas coloridas da época.

A carapinha farta dos anos 70, o rancho de Neverland, o 'moonwalking', os sapatos pretos com as meias brancas para o efeito do passo de dança ser ainda mais visual, o primeiro negro a passar na MTV, os 700 milhões de discos vendidos, o videoclip do 'Black and White' ou as campanhas de angariação de fundos para causas humanitárias são apenas momentos, mas eu prefiro guardar os sons que ainda estão nos discos cá em casa.

Michael Jackson morreu com a mesma idade da editora que transformou o panorama musical no mundo, a Motown. Juntos gravaram 18 álbuns. E também há uma música antes e depois dele.

25/06/09

Acabou-se a Farrah

Morreu hoje, aos 62 anos a actriz Farrah Fawcett, considerado um sex symbol para muitos homens e mulheres em todo o Mundo. Não é o meu caso. Fica aí a notícia.

Amores com amores se apagam

Annapurna Base Camp, Nepal


Estava para aqui a pensar na importância que as coisas têm e depois deixam de ter.
Como não cheguei a nenhuma conclusão decidi divagar sobre o número que mais gosto: o 23.

23 palavras podem ser suficientes para se fechar um capítulo. Basta juntar-lhes um dois pontos, uma vírgula e dois artigos, por exemplo. E a coisa está feita. Quem o faz, é porque não dá muita importância à coisa, é a melhor maneira: fugir para a frente, tratar como uma doença passageira e voltar a olhar para o espelho e ver apenas aquilo que lhe interessa.

Pois eu dificilmente conseguiria sacudir a poeira com 23 palavras. Gosto do 23, é o meu número, gosto daquela conjugação do 2 e do 3, e não faria isso ao pobre número. Mas estas coincidências acontecem. É a vida.

Na escola era o 23, o 23 aparece-me à frente em muitas situações, gosto de pensar no 23 como uma boa escolha, como um bom sinal. E não é que o foi novamente? Mais uma vez o 23 surge-me como uma demonstração deste grande equilíbrio do Universo. Com 23 matas, com 23 morres. Não é bem assim, mas isto também não é a Bíblia.

O 23 surge quase sempre de onde menos se espera, fruto das combinações, dos números das portas, das matrículas, das vidas. E deixa sinais. Uma vez encontrei um 23 em azulejo numa parede imensa de Praga (está junto à Catedral, num canto da praça, se quiserem confirmar). E hoje vi-o outra vez, escondido e dissimulado.

É apenas um número. Pois é. Mas é meu. E diz-me muito, dá-me muitos sinais. Por acaso, já contaram as letras do título deste post?



Cuidado, tens mail

Oranjestad, Aruba

Ele apaixonou-se por ela. E ela por ele. Foi a típica história de "boy meets girl, girl meets boy". Só que o "boy" é casado. E pior que isso, é político. E ainda para piorar as coisas, é político nos EUA. "Boy" e "girl" trocaram uns emails, falaram do que sentiram, entraram em pormenores pessoais, mas sem ordinarices, e foram descobertos por um jornal norte-americano.

Mark Sanford é o "boy", Governador da Carolina do Sul. Maria, nome fictício - porque o que interessou foi estragar mais uma carreira política com base num caso extra-conjugal - é argentina, de Buenos Aires. Sanford era uma das esperanças republicanas para uma próxima nomeação presidencial, mas tramou-se, como conta a CNN.

Andou a trocar emails com a argentina onde falou de uma "situação de amor impossível e sem esperança". E classificou-a deste modo, nos tais emails a que o jornal The State teve acesso: "Tu tens uma graça particular e uma calma que eu adoro. Tu tens um nível de sofisticação que encaixa com a tua beleza. (...)Podia dizer que tu tens a capacidade de dar magníficos beijos suaves ou que gosto das tuas linhas bronzeadas ou que amo a curva das tuas ancas, (...) no brilho que se apaga da luz da noite - mas, hey, isso já seria entrar em pormenores sexuais..."

O Governador chega mesmo a questionar-se, nestes emails privados a que ninguém deveria ter tido acesso:

"How in the world this lightening strike snuck up on us I am still not quite sure. As I have said to you before I certainly had a special feeling about you from the first time we met, but these feelings were contained and I genuinely enjoyed our special friendship and the comparing of all too many personal notes ..."

Mark Sanford não é um santo. Traíu a mulher com uma moça argentina, trocou uns emails mais íntimos, falou dos seus sentimentos e foi apanhado. Mas e se Mark fosse apenas Mark e não o Governador da Carolina do Sul? Ah, é nos EUA, as coisas lá são diferentes.

E se fosse cá? Cá ainda não chegou a devassa da vida privada dos principais políticos, mas não deve faltar muito. Já se deu o primeiro passo - muito cauteloso - com o namoro do Primeiro-Ministro, mas para quando a descoberta da amante de um ministro ou a homossexualidade não-assumida de um qualquer político da Oposição?


24/06/09

Um abraço ao Copérnico

Deserto de Wadi Rum, Jordânia

Afinal, a Terra não está no centro do Universo.

Às vezes parece que somos nós o ponto mais importante da vida. E vai-se a ver e não é bem assim.
Não é fácil chegar a esta conclusão, digo eu. E a História prova-o: não fosse o polaco Copérnico ter, em 1514, abanado as consciências e dizer que afinal a coisa não era bem assim e ainda hoje estaríamos a pensar que iluminávamos o resto do Universo.

Quase 500 anos depois, ainda há quem pense que Copérnico era um grande aldrabão. E há quem continue a defender que somos nós que temos que ficar parados enquanto todo o Universo gira à nossa volta. Mas quem é que ainda pensa isso?, pergunta novamente a voz do occipital.

Todos nós.
Em determinados momentos da nossa vida, pensamos isso. Pensamos que os outros devem girar sorridentes para nós, que dependem da nossa luz, da nossa disposição, do nosso bem estar. E que os outros podem viver de acordo com as nossas mudanças de órbita. Errado.

No meu sistema solar, todos os planetas olham uns para os outros de igual para igual. Sejam maiores ou menores, com mais ou menos luas, mais quentes ou mais frios, mais inóspitos ou mais acolhedores, todos os planetas têm direito a dar luz para os restantes e receber deles alguma coisa. É como a democracia, mas em bom.

Vota abaixo

Ilhas Galápagos, Equador

Abri o espaço para a nova mensagem e pensei que me apetecia falar das eleições legislativas e autárquicas serem no mesmo dia. Enganei-me.

Eu prefiro que sejam em dias separados, porque uma coisa é votar para a Câmara - ou Cambra, como se diz em português da rua - e outra é votar para o Governo. Porque os autarcas não têm que ser metidos no mesmo saco dos deputados nem uns pagarem pelos erros dos outros. Que grande parvoíce, até parece que os boletins de voto são os mesmos, está a dizer-me aquela voz junto ao occipital.

Não, de facto, não são, mas num país com tamanha iletracia, vai acontecer - com toda a certeza - que milhares de eleitores vão confundir o papel da Cambra com o papel do Governo e votar errado. Ou, para simplificar a coisa, votam igual nos dois porque não lhes apetece pensar muito. E podem também fazer pagar o autarca pelos erros do partido nacional quando o presidente da Cambra ou da Junta até fez um bom trabalho. Agora, poderia colocar aqui um "e vice-versa", mas não estou a ver muitos casos em que a imagem de um partido seja melhor que a de um autarca. Se calhar há, mas não estou mesmo a ver.

Pois então, eu gostaria de ter duas eleições em dias separados. Já sei que me vão atirar com o argumento do despesismo, mas se calhar é um pouco tarde para pensar nisso. Despesismo também é cada partido chegar ao Poder e trocar os nomes dos ministérios e secretarias de Estado e com isso obrigar a uma mudança de papéis oficiais, cartões dos funcionários, envelopes, etiquetas, publicidade institucional, ... Isso cheira-me mais a despesismo e nunca ninguém se lembra de apontar o dedo.

Uma coisa é a Câmara, outra coisa é o Governo.
Dois orgãos, duas eleições, duas campanhas.
A mesma triste e rídicula abstenção.

23/06/09

Entrevista com o vampiro

Jerash, Jordânia

Arrependido?
Claro que não. Foi o que tinha que ser.

Farias a mesma coisa?
Claro que sim. Foi assim que o senti na altura.

E mudarias alguma coisa?
Muita coisa, mas nada que dê para mudar.

Queres ser mais específico?
(Risos) Tenho mesmo que o ser?

Aqui quem faz as perguntas sou eu.
Ok, então não vou ser mais específico. Estou a brincar, mudaria o tempo, o espaço, a forma e o conteúdo. Chega?

Tu é que sabes. Em algum momento acreditaste que poderia resultar?
Sim, acreditei. No momento em que lhe perguntei se queria, nos momentos em que as coisas corriam bem, nos momentos em que fui feliz.

Foram muitos?
Foram alguns.

E maus momentos também houve?
Claro que sim, senão não estava aqui agora. Mas o caminho não se faz por aí, isso está tudo ultrapassado. Mas não esquecido.

Tiras alguma lição de tudo isto?
Claro que sim: o erro faz parte da solução.




22/06/09

O Calimero e a Abelha Maia

Deserto do sal, Tunísia

Três anos de pena suspensa.
Nuno Cardoso, o ex-presidente da Câmara Municipal do Porto, foi hoje condenado por prevaricação, por ter mandado arquivar indevidamente processos de contra-ordenação do Boavista FC. O juíz-presidente, João Amaral, referiu, na leitura do acordão, que existiu "intenção de beneficiar o Boavista", "elevada ilicitude dos factos" e "teia" entre o poder autárquico e os clubes de futebol.

O caso remonta a 2001, quando o autarca perdoou uma coima ao Boavista por construção sem licença. Com este acordão, Cardoso perderia o seu mandato, se estivesse a exercer qualquer cargo público. Mas não está. Por pouco tempo, porque à saída do tribunal, o ex-autarca - agora condenado por prevaricação, relembro - afirmou: "Estou de volta à política". Teve ainda tempo para dizer que está mais preocupado com a justiça divina que com a dos homens.

Três anos de pena suspensa. Cardoso, Avelino, Valentim, Felgueiras, Isaltino...
A vergonha continua dentro de momentos.


Neda na manga

Serra da Estrela, Portugal

Em 1989, na Praça de Tiananmen, as imagens do estudante que enfrentou o carro de combate deixaram marcas profundas. Mostraram a oposição ao regime chinês, a falta de democracia, o atropelo - literal - pelos direitos humanos.

Em 2009, o vídeo de Neda, a mulher iraniana atingida por um tiro no peito no seguimento de uma manifestação em Teerão, é a face visível de uma contestação que não vai ficar por aqui. Ahmadinejad ganhou as eleições, Moussavi contesta o resultado, os clérigos não querem um banho de sangue.

Demasiado tarde, Neda terá morrido enquanto protestava de forma pacífica pelas ruas da capital do Irão. Duas décadas depois de Tiananmen, os atropelos na China continuam. Esperemos que em 2029, outras mulheres iranianas possam exercer livremente os seus direitos.