Dona Adélia... acha que dá para ligar a televisão?
Ó meninos, vocês sabem que a televisão está sempre desligada à hora de almoço.
Mas é que um avião foi contra um prédio em Nova Iorque, telefonou-me um amigo a dizer.
A sério?
Sim, queríamos ver.
Tá bem, pronto, mas não se habituem.
Quase todos os dias íamos ali almoçar. Em grupo, a dois ou a três, era o nosso poiso. A comida não variava muito, mas o Beiradouro era a nossa cantina. Naquele dia, estava eu e o Carlinhos. Eu comi carne à portuguesa, ele não me lembro.
A Dona Adélia ligou a televisão e estava a dar a imagem de uma das torres do World Trade Center a deitar fumo na metade superior.
Bem... que cena!
Ai meninos, que desgraça.
Olha, olha... estão a dar repetição. Xiii...
Não era a repetição, era o segundo avião. Em directo.
O telefone não parava de tocar, a carne à portuguesa ficou fria e já nem houve tempo para a mousse de manga feita pela Armanda, a filha da Dona Adélia que nos impunha respeito.
Ouve, esta cena é única, estamos a viver uma coisa histórica.
Pois estamos. Temos que fazer alguma coisa.
Bora para Nova Iorque?
Quando? Hoje?
Sim, ou amanhã, quando der. Eu meto férias e tudo.
Bora.
Depois de muita discussão, o Carlinhos acabou por ir. Não me deixaram meter férias e ir para lá em reportagem, mas foi ele. E ainda bem que foi assim.
Oito anos depois, continuo a sentir saudades daquele 11 de Setembro.